19.8.14

Sociedade dos Poetas Mortos

Carpe Diem e o direito de chorar pela morte de Robin Williams 


por Cecília Goursand



E nessa semana que passou a vida deu mais uma vez seu grito de iéié.
Que o querido Robin Williams morreu na última segunda-feira, o mundo inteiro viu. E sentiu. E chorou. E metade lembrou que ele existia e virou fã. Mas que tem rolado muitas críticas ao ato de virar fã e chororô alheio, pouca gente sabe.

Que os haters de plantão me perdoem, mas sou a favor do choro, de virar fã quando alguém especial morre e do Carpe Diem em seu mais puro significado: que engloba isso tudo que falei e tira da teoria e passa para prática o 'cada um faz o que quer' da vida. Independente de ser um momento ruim ou bom. Triste ou alegre. Rá.

                                                  Heheheuheue, piadas à parte.

Até ai, tudo muito bonitinho e nada fácil. Sustentar uma atitude nunca é fácil. E que atire a primeira pedra quem nunca deu valor só quando perdeu algo ou alguém. Não deixa de ser meia verdade. Nesse mundão cheio de responsabilidades, informações e vida adulta é difícil engolir ele inteiro, de uma vez, achando que é bala soft. Precisamos de algo ou alguém (nem que seja a morte) que nos lembre que brincar, respirar e viver cada minuto ainda é permitido.

E apesar de soar como propaganda de absorvente ou o texto do filtro solar, quando alguém especial se vai e ficamos frente a frente com nossa finitude, rola o desespero. Ele aparece em forma de lágrimas, desculpas e curtidas no facebook. E defendo porque é reconhecimento, de uma forma ou de outra .

Por isso, quase ninguém pára pra pensar que o que acontece nesse momento de virar fã póstumo assumido é, na (minha) verdade, uma tentativa de resgatar a essência do agora. Do tipo: "não se vá, nemequittepas." Como se um pedaço GRANDE da vida estivesse indo embora. E tá. Como se agarrar à sensações antigas nos trouxesse conforto e fosse questão de necessidade vital. Voltar à época do joelho ralado ou uma ferpinha fincada no dedo, principalmente. Era vivência. Era a gente fazendo história. Era tempo de Carpe Diem.

Voltar àquela sensação reprimida pela vida adulta. Às tardes depois da aula, comendo Trakinas recheado - sabor morango - com leite e Toddy vendo "Uma babá quase perfeita" na T.V e desafiando uma possível palmada deixando de fazer o dever de casa. Ou à um sábado chuvoso, com cara de solidão e o consolo de ver Jumanji na tensão, para espantar o tédio. Sem contar nas comidas imaginárias que tentávamos visualizar (and comer. Quem nunca?), quando a fome apertava, como os garotos perdidos da Terra do Nunca faziam em Hook- a volta do capitão gancho. Ou ficar entre choros e risadas nas aulas do Sr. Keating, o professor de literatura na academia Welton do filme Sociedade dos Poetas Mortos. (Best filme ever)

Interpretado deliciosamente por Robin Williams, Sr. Keating, ensinava sobre a literatura e a vida. Dizia que poema e viver não eram exatos. Que podíamos ser sempre mais que o modelo padrão oferecido. Que deveríamos buscar nosso próprio andar. E que se fossemos dominados pelo medo de alguma situação era só subir um degrau, ainda que da cadeira para mesa, para ver o mundo e a situação de outro ângulo.



Ensinou que podemos ser donos de nós mesmos e que é permitido buscar e lutar por aquilo que gostaríamos de ser na vida. Ainda que implicasse na morte de um dos personagens. Muito embora, mais que um suicídio, morrer naquela ocasião era se libertar e assinar embaixo. Era hora de bater o pé, além das botas e ser o que quisesse. Era fugir do modelo. A única solução. Era tempo de Carpe Diem.

Infelizmente, a cada dia e com a morte de Robin, fica nítido o quanto nossa sociedade ainda funciona como a Academia Welton. Priorizando a tradição. Espremendo dia a dia a autenticidade dos desavisados.
É necessário se encaixar em algo, seguir comportamentos ditos certos. Acreditar em certo e errado.
Uma vez sucesso, sempre sucesso. Uma vez comediante, sempre comediante. E é por isso que a morte dele ainda nos assusta tanto. Esperávamos que aquela pessoa, dona de nossos sorrisos fáceis, também sorrisse fácil e sempre.

Mas esquecemos que somos alunos dessa sociedade com cara de Academia Welton e ele também. Alunos desse lugar que fala que quem vive de passado é museu. Que não permite mudanças. Que precisa cumprir prazos e aparências. Que não permite que choremos a morte de alguém não próximo. Que não permite ser.

No dia 11 de agosto, foi embora um pedaço da vida. Da minha, da sua, da gente. Mas sem arrependimento algum por ignorar todas as responsabilidades e sugar todo o aprendizado que algum filme dele proporcionava. Se era ficção pouco importava. Era, foi e sempre será, se a gente quiser, tempo de Carpe Diem. 

E pra ele, também.



Ficha Técnica:

Onde e quando: Estados Unidos, 1989
Olhar de quem: Peter Weir (direção) ; Tom Schulman (roteiro)
Quem faz parte (elenco principal) : Robin Williams, Ethan Howke, Robert Sean Leonard
Quanto tempo: 128 min.