29.4.14

O escafandro e a borboleta, 2007

por Cecília Goursand



Querem me levar para a reabilitação, mas não quero ir. Mentira. Tô indo todo dia e é até engraçado. Engraçado perceber que por anos, desafiei a física e imprecisamente a gravidade ao tentar fazer movimentos leves com os braços e pernas que, por algum tempo - anatomicamente - eram considerados impossíveis. Do Flamenco ao Jazz, a dança tem sido minha religião. 

E se na última postagem falei que era preciso nos agarrar a algo, o meu algo (o movimento dançante) desagarrou de mim. :( Continua engraçado, porque a gente sempre cai na pretensão de achar que não vai acontecer com a gente, que somos imortais e blablablah. E porque agora, ao invés de tentar fazer movimentos desenhados no ar, eu, que não era nada básica, preciso humildemente voltar aos básicos na fisioterapia. E é engraçado, porque a gente ri para não chorar. Sentindo agora, dia após dia, a dor-delícia de reabilitar. Feito o A.A: "Oi, voltei a ser a Cecília que tanto queria, não danço há 15 dias e a vida não flui no meu corpo." "- Ooii, Cecíliaaa. Bem vinda ao clube." 

Que me perdoem os que se identificaram, mas pretendo não fazer parte dele por muito tempo. Até porque, nem só de novela mexicana vive uma pessoa dramática. Apesar de insuportável, é um momento legítimo, preci(o)so e insubstituível. Sem ele, não estaria escrevendo aqui. Muito menos voltaria a ser eu.

Entre um exercício e uma bolsa de gelo, pensei em Jean Dominique e vi que a história era quase igual. Ele, que poeticamente mostra sua (sobre)vivência enclausurada em "O Escafandro e a Borboleta", com as ferramentas que tinha, foi. Foi do jeito que dava, com as pessoas que dava, com a pálpebra que restava. Amenizou a angústia do jeito que deu. Amou daquela vez como se fosse a última...como diria Chico . Jean, de fato re-construiu sua vida com o que tinha. Ele também era desses: editor na revista Elle, ryco financeiramente, pobre vidamente. Desconstruía a vida e o simples, não curtia.  Pretensiosamente, também se achava imbatível. Queria engolir as modelos, o mundo e a vida. Infelizmente, não houve cérebro que aguentou. 

Se aguentou, deixou sequelas. Gigantes e eternas como um escafandro: pesado, doloroso, sufocante, que paralisa qualquer movimento corporal, exceto o de sua imaginação. Quando nossa morada se torna nosso próprio casulo, é difícil virar borboleta. Mas ele foi e voou alto. Virou borboleta em forma de livro, que tijolo por tijolo regado de paciência e piscadas, concretizou. Por sorte, virou filme ♥. E como eu ainda não tenho a manha poética que Julian Schnabel teve ao dirigi-lo, seguimos com mais razões regadas de esperança, gelo e lágrima para ver O escafandro e a borboleta :


1: Quem me conhece, sabe que evito falar de técnicas cinematográficas, mas é impossível não falar da arte de Julian ao expressar de forma tão próxima e nítida o enclausuramento de Jean Dominique. É como se fôssemos/vivêssemos /tivéssemos seu olhar. (A propósito, tá ai um diferencial para quem tem preconceito com filmes não Hollywoodianos.)




2:  Pra você que só dá valor quando perde, tamo junto! :D 



3: Mas vemos que, assim como no filme, enquanto houver um mínimo de vida, nem tudo estará perdido. Mesmo se aquilo que agarramos desagarrou da gente....



4: O filme pode parecer o maior clichê do mundo. Daqueles que falam que devemos viver como se não houvesse amanhã e que se esse amanhã chega em forma de repouso quase absoluto, perdemos a vida. Vulgarizaram o valor da vida, mas quem disse que o vulgar não é compreensível e aceitável? Quem falou que não podemos considerar os clichês da vida? Hein?Hein? Ele pode salvar.



5: As vezes quem esperamos contar, acaba sumindo na hora do aperto. Seja por que não dá conta de lidar ou porque não era amor, era cilada. :/
Em compensação, sempre terá (novas) pessoas para torcer por você e querer seu bem :)




Tem ele aqui!!

Ficha Técnica:
Quando e onde: França, 2007
Olhar de quem: Julian Schnabel
Quem faz parte: Mathieu Amalric, Emmanuelle Seigner, Marie- Josée Croze, Max Von Sydow
Quanto tempo: 112 minutos



2 comentários:

  1. Ai, Jesus..sentindo que vou ter que preparar um lençol para enxugar o rio de lágrimas qdo eu assistir..he,he,he,

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  2. hahahaha mas é a nossa cara esse filme, Pat ♥ só pela poesia dele e o olhar do diretor, já vale a pena ver. Nunca vi outro filme parecido. Que aproxima tanto quem tá vendo do personagem!

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Vem que tem :D